Protocolos de Julgamento com Perspectiva Interseccional de Gênero e de Raça, com Capacitação de Magistrados em Direitos Humanos, Gênero, Raça e Etnia: necessidade de Capacitação e Letramento no ambiente de Trabalho

DIREITO TRABALHISTA

Paula Brum | Advogada

9/4/20243 min read

Nos últimos anos, o acervo legislativo brasileiro, em respeito aos princípios dos direitos humanos e da dignidade da pessoa humana, evoluiu sobremaneira em resposta à luta de entidades de cunho social e das ações afirmativas que proliferam pelo país.

Leis como a criminalização do racismo e da homo/lesbo/transfobia, bem como a Lei Maria da Penha e sua proteção às mulheres, trouxeram novas perspectivas dentro dessa luta por igualdade.

Como tratar todas essas questões quando as relações sociais, familiares, trabalhistas, empresariais e outras chegam ao Judiciário? Como igualar os desiguais e proporcionar mecanismos probatórios que os considerem em sua mensuração?

O Conselho Nacional de Justiça editou, no ano de 2021, o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, em virtude das recomendações ao Brasil feitas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Por outro lado, a Resolução 492 de 2023 do CNJ foi além, pois, ao tratar da adoção do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, acabou por instituir a obrigatoriedade de capacitação de magistrados e magistradas em Direitos Humanos, Gênero, Raça e Etnia, numa perspectiva interseccional.

Na questão racial, o CNJ lançou a Recomendação 490 de 2023, que instituiu o FONAER – Fórum Nacional do Poder Judiciário para Equidade Racial. Através dos estudos e propostas concretas, construídas por seu grupo de trabalho, será editado o Protocolo de Julgamento com Perspectiva Racial.

Hoje, temos alinhamentos legais contra discriminações em razão de gênero, raça, condição sexual e outros. A lei penal prevê sanções, na esfera civil penalizações para assédios e danos morais, bem como Protocolos de Julgamentos que indicam e capacitam magistrados e magistradas para decisões que respeitem e considerem essas perspectivas.

O Banco de Sentenças e Decisões cresce, enquanto vemos julgados considerando tais alinhamentos e operando na proteção dos indivíduos contra discriminações.

Recentemente, um acórdão do TRT15 chamou a atenção ao condenar uma empresa por racismo recreativo sofrido por um empregado no ambiente e horário de expediente, sob o olhar complacente de superiores diretos. Tal decisão está amparada no capítulo do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero que trata da Justiça do Trabalho e alerta para desigualdades e assimetrias correlatas às relações de emprego.

A empresa foi responsabilizada por omissão, por não ter coibido as práticas racistas, por não ter implementado mecanismos de prevenção e por não ter acolhido o empregado vítima dos atos racistas.

Se, por um lado, o Judiciário constrói mecanismos de enfrentamento às discriminações, como as empresas podem, internamente, trabalhar essas questões e se proteger de atitudes e acontecimentos que possam futuramente se converter em condenações judiciais?

Entramos no capítulo da responsabilidade social das empresas e da necessidade de capacitação, letramento e alinhamentos necessários para sua contribuição na formação de uma sociedade mais diversa, justa e livre de discriminações. As empresas não mais são vistas apenas como geradoras de capital, emprego e renda, mas também como responsáveis por essa construção social.

A organização empresarial, qualquer que seja seu tamanho ou alcance, precisa nascer ou se adaptar às novas perspectivas para proteger seu bom nome, proteger aqueles que cotidianamente trabalham ou transitam por suas instalações (físicas ou no meio virtual) e para se autoproteger dos atos e fatos perpetrados por terceiros em seu nome ou em seus espaços de atuação.

Capacitação e letramento são questões a serem tratadas de forma técnica, com aplicação em todas as esferas e para todos aqueles que possuem envolvimento direto com o desenvolvimento dos trabalhos. Dos proprietários e diretores, passando por todo o quadro de empregados, até a contratação de empresas terceirizadas, deve constar o apontamento da existência de um protocolo de não discriminação na empresa. É uma medida que, como profissional experiente do Direito, eu indico e ofereço para empresas.

Há mais de uma década oferecemos para empresas o que chamávamos de palestras de alinhamento sobre direitos e deveres no ambiente de trabalho. Hoje, novos termos e nomenclaturas surgiram, mas a cada dia tal técnica é mais necessária para que as empresas estejam alinhadas no aspecto social aos impactos das relações em seu ambiente de trabalho e no meio no qual estão inseridas.

A boa prática social, com oferecimento de capacitação, letramento e, quando necessária, a instituição de comitês internos de compliance, além de proteger a empresa, contribui para os novos parâmetros não discriminatórios que a sociedade exige.